Sinto um
gosto amargo em minha boca, algo prende as minhas mãos e minhas pernas. Estou
trancado num espaço tão pequeno e quase não consigo respirar, foram quase dois
anos preso aqui, sem conseguir gritar, me mexer. Sou uma estátua viva, preso em
mim mesmo, o que antes me movia, hoje me ata. Perdi os meus instintos, sou
animal selvagem preso em cativeiro, em uma jaula em que eu mesmo me coloquei. O
gosto amargo em minha boca parece mofo, resultado de tanto tempo sem falar. Aos
poucos consigo me soltar, minhas costas doem e noto que há marcas de cordas em
meus pulsos, autoflagelos, me levanto e saio da caixa, subo as escadas e abro a
porta, o sol brilha lá fora, tão forte que demoro minutos pra conseguir notar
onde estou. Não estou nem no céu, nem no inferno, estava preso dentro de mim,
num corpo de moleque que não comportava mais o homem que me tornei. Pego a
caderneta de bolso e a caneta, o tempo das anotações voltaram, de rabiscar,
amar, rascunhar. Amar em Rascunhos.